Abdicação
Fernando Pessoa
"Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços
E chama-me teu filho.
Eu sou um rei
que voluntariamente abandonei
O meu trono de sonhos e cansaços.
Minha espada, pesada a braços lassos,
Em mão viris e calmas entreguei;
E meu cetro e coroa — eu os deixei
Na antecâmara, feitos em pedaços
Minha cota de malha, tão inútil,
Minhas esporas de um tinir tão fútil,
Deixei-as pela fria escadaria.
Despi a realeza, corpo e alma,
E regressei à noite antiga e calma
Como a paisagem ao morrer do dia."
Muitas vezes, batem a tristeza e a vontade de abandonar todos os projetos de uma vida inteira, porque simplesmente nos cansamos de tanta luta. Pensamos que nossos esforços foram em vão, que nossas lutas foram inúteis, que perdemos tempo naquilo que estávamos planejando e que, porventura, não teve sucesso. Não devemos, entretanto, desistir. Para cada noite escura e solitária, há um amanhecer pronto para que possamos recomeçar.